Advogado especializado em Direito do Consumidor, Vinicius Zwarg explica como empresas envolvidas em uma campanha de chamamento devem agir
- Quem não informar sobre riscos à segurança e à saúde fica sujeito a ação criminal
- Cada vez mais medida deixa de ser vista como algo negativo, mas como um elemento que dá confiança ao mercado de consumo
RIO - A Galzerano anunciou nesta quarta-feira o recall de mais de 117 mil cadeirinhas de bebê para carro devido à possibilidade de abertura do fecho do cinto de segurança, fornecido pela italiana Sabelt. O chamado foi feito seis dias depois de outras três marcas do mesmo produto —Chicco, Burigotto e Peg-Pérego — também convocarem recall de 13 mil cadeiras automotivas por causa do mesmo problema. O advogado Vinicius Zwarg, especialista em direito do consumidor, respondeu a dez perguntas do site do GLOBO sobre recall: de como é feito a sua importância para o mercado de consumo.
Para que um recall seja feito, necessariamente deve ter havido algum acidente de consumo?
Não. O recall deve ser feito sempre que se identifica que um produto pode pôr em risco à saúde e à segurança do consumidor. E isso pode ser percebido sem que um acidente tenha acontecido, ao se identificar uma falha que pode levar a riscos para a saúde e à segurança. Pode haver um chamamento de troca, por algum problema ou defeito, que não gere riscos à saúde e à segurança. Mas isso não se enquadra no que chamamos de recall.
Quem deve ser comunicado sobre um recall?
As autoridades e, principalmente, o consumidor. Este é o principal interessado nessa informação. A pessoa pode, por exemplo, comprar um produto em São Paulo e viajar para o Acre. Por isso, é importante que a informação chegue ao maior número possível de pessoas. A legislação prevê que o recall seja comunicado ao Estado e divulgado na mídia, na imprensa, no rádio e na TV. O custo dessa divulgação fica a cargo do fabricante do produto.
Como deve ser feito um recall?
Todo recall precisa de um plano de atuação. O objetivo de tal plano é orquestrar como será feita a comunicação aos órgãos do governo, a publicidade da ação, como será feita a troca, o reparo ou a substituição do item convocado, enfim, tudo o que está envolvido no processo.
Se um produto comprado no exterior estiver sujeito a recall lá e não no Brasil, o consumidor pode exigir sua substituição, troca ou reparo caso a empresa atue no país?
Sim, é possível. No caso recente de próteses de silicone francesas com defeito, o recall foi feito inicialmente na França. Só depois foi realizado no Brasil. Neste caso, houve suspensão da venda das próteses no país.
E se o recall de algo importado ou trazido diretamente pelo consumidor do exterior não chegar a ser anunciado no Brasil. Neste caso o consumidor pode pedir uma troca, substituição ou reparo do fabricante no país?
Ele deve comunicar o problema aos órgãos de defesa do consumidor e entrar em contato com o fabricante. Se o produto oferecer risco à saúde ou à segurança, tem de ser consertado ou trocado. Mas não podemos esquecer que as normas de funcionamento e de qualidade de produtos e serviços não são as mesmas em todos os países. Uma não exigência em termos de segurança também é uma característica cultural e regida pela legislação local. Os airbags, por exemplo, há anos são itens de série em automóveis fabricados e comercializados no exterior. No Brasil, só deixarão de ser um acessório e se tornarão um item obrigatório no ano que vem.
Quais sanções podem ser aplicadas ao fabricante que sabe de um problema e não faz um recall?
Há três esferas de responsabilidade: civil, administrativa e penal. A empresa pode ser punida administrativamente por meio da cobrança de multas ou, por exemplo, de suspensão de suas atividades. Civilmente, por dano moral aos consumidores cuja segurança e saúde foram colocadas em risco. E quem não fizer o recall de um produto que coloque em risco o consumidor pode responder criminalmente por essa prática.
É possível uma empresa atender a 100% dos consumidores de um produto que tenha sido submetido a um recall?
Sim. Eu já acompanhei casos em que todos os clientes foram contatados. A empresa ligou para cada um deles e conseguiu acesso a todos. Mas em alguns casos isso é quase impossível. Recalls de alimentos ou fármacos são mais difíceis, pois a compra é feita por um grupo grande e muitas vezes, até o problema ser identificado, o produto já foi consumido.
Fazer um recall no Brasil ainda é um desafio?
Há processos de produtos de todos os tipos. E isso é relativamente recente no país, tem cerca de 20 de anos. Nos Estados Unidos, há um número infinitamente maior de recalls do que aqui. Mas lá essa é uma prática já consagrada, compreendida tanto pelas empresas quanto pelos consumidores.
E aqui? O recall ainda é visto de forma negativa?
O recall era visto como algo negativo, mas isso está mudando. Cada vez mais, se enxerga essa prática como algo que não é ruim. Mas como uma ação que fortalece a confiabilidade no mercado de consumo. Ainda é uma situação atípica para a maioria das empresas, elas não estão começando a se acostumar. O setor automobilístico talvez seja o mais acostumado com as práticas, os procedimentos de um recall.
Recentemente, o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), do Ministério da Justiça, lançou uma série deorientações às empresas sobre como comunicar um recall, incluindo por exemplo as redes sociais. Como o senhor avalia essa ação?
Tudo o que ajuda é saudável. Mas a regra não pode ir além do que o Código de Defesa do Consumidor prevê. Como orientação, é importante e válido. Afinal, uma informação bem dada é uma necessidade nesse processo e ajuda a melhorar o mercado de consumo.